terça-feira, 1 de maio de 2012

A Morte é Sobrevalorizada!

Agora que já lancei a bomba aqui vai o resto. Eu sei que é uma questão cultural e que possivelmente eu nunca vou ter a força de espírito necessária para celebrar a vida de alguém que me seja especial no dia em que toda a gente estiver de luto e a chorar a milonga com a respectiva morte mas também tenho direito à minha posição sobre o assunto e aqui vai ela.
Antes de eu morrer, e espero que seja daqui a muitas décadas, vou deixar por escrito as minhas intenções para o meu funeral, ou melhor: para a ausência do funeral. Não quero cá missa, nem velório nem flores. Não quero nada. Não quero cá declarações sobre a boa pessoa que eu era porque eu até nem me considero assim tão boa pessoa que justifique tal alarido. Não quero cá pretos e véus e mirones a limpar as lágrimas de crocodilo enquanto reparam quem está, quem não está; quem parece mais abatido quem não parece. Tretas ..
Quando a minha avó partiu tivemos família a sair de todos os buracos no dia do funeral e durante os 10 anos que ela batalhou, com qualidade de vida, o Mr. Cancro contam-se pelos dedos de uma mão as vezes que apareceram. Para quê aparecerem no dia do funeral? Para homenagear? Para marcar ponto? Para nós mais tarde nos lembrarmos que eles vieram? Nos funerais não se marca ponto nem presença e da minha parte só me lembro que eles e outros não apareceram em vida. Se existe mesmo vida para além da morte a minha vovó estava a olhar cá para baixo e a pensar "o que é que estes palhaços fazem aqui AGORA?" e se não existe ela não os viu, não os ouviu, não se riu com eles, não os fez rir, não passaram horas na conversa a reviver momentos passados; não comeram juntos, não beberam juntos. Então para quê aparecer?
Temos que celebrar as pessoas em vida! Temos que arranjar tempo para estar com elas enquanto elas estão vivas e não largar tudo e todos quando recebemos a tal chamada. Para quê? Para quê? Temos que aproveitar cada momento com aqueles que gostamos e não deixar para depois. Sair, conhecer novas pessoas, marcar corridas, cafés, cinemas, passeios, viagens, tudo!! Façam tudo com todos. Não percebem que um dia tudo vai acabar e nem trabalho vão ter para ocupar o vosso tempo porque ... VÃO ESTAR MORTOS? Como é que ninguém percebe isto? Como é que continuam envolvidos na vossa rotina a adiar, a adiar, a adiar como se tivessem todos os dias do mundo para vocês! Enfim, parece-me um bocado imaturo pensar assim.
Não percebo! Uma pessoa morta é mais importante do que uma pessoa viva? Então é por isso que andamos sempre a adiar cafés e a dar justificações como "tenho muito trabalho" ou "tenho que estudar"? Para guardarmos o tempo para quando estivermos mortos!! Só pode ser isso.
Em 100 pessoas que estão num funeral talvez 10 estão lá para a verdadeira "homenagem". O resto foi lá ver como estava o morto, a qualidade do caixão, se as flores eram de plástico ou não, se estavam lá todos os membros da família ou não e por fim dizer a pessoas com quem nunca falaram na vida e que possivelmente desprezam "se precisares de alguma coisa diz". Eu não preciso de nada pah! Mas que hipocrisia dos diabos. E é por isso que eu não quero funeral e é por isso que eu faço sempre os possíveis para estar com toda a gente sempre que posso e condeno muito, mas mesmo muito, todos os meus amigos que não fazem as coisas por falta de tempo. Pronto, é só para avisar que quando eu morrer não vão ter aquele tempo de expiação pelo tempo que não arranjaram para estar comigo. Porque o funeral para esta cultura do preto da treta é isso mesmo: o funeral serve para expiar a culpa de não termos lá estado em vida! E atrevem-se a fazer o luto como forma de ostentação da sua tristeza! Que palhaços meus amigos. Quem sofre, sofre com branco, azul, verde, cor de burro quando foge!
Ontem foi o teu dia e cada uma de nós o lembrou como quis porque não há um dia em que eu não me lembre de ti e não há um dia em que eu me arrependa de não ter ido ao teu funeral porque te celebrei todos os dias que passei contigo em vida, Avó.

Camila da Conceição Araújo de Carvalho, 30.10.1937 - 30.04.2004

4 comentários:

  1. Olá, li um pouco do teu blog e pareceu-me interessante. Não li mais porque é super complicado ler estas letras! pode ficar giro e tal...mas é mesmo complicado ler. em dois posts fiquei a trocar os olhos todos :/

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    1. Olá :) Realmente sempre achei um pouco difícil ler estas letras mas gostava tanto delas e como nunca ninguém teceu comentários acerca disso não mudei mas agora consegui encontrar outro tipo de letra que gosto tanto ou mais por isso espero que voltes *
      Obrigada pelo comentário.

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  2. Adorei este texto. Estou sem palavras...
    Uma das coisas que me chocou profundamente, no funeral de uma das pessoas mais importantes da minha vida, foi o facto de comentarem e minha ausência e, quando eu apareci mais tarde a minha indumentária ser de cor vermelha... Toda a gente ficou ofendida, chocada mas, ninguém sequer tinha a noção que eu tinha tido um exame nesse dia e, que a roupa que eu tinha vestida era uma das que ele mais gostava...
    Enfim, temos de viver em sociedade mas, não temos de gostar dela.
    =')

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  3. Totalmente de acordo. Nunca percebi a pancada de aparecer toda a gente como viúvinhas muito desgostosas pelo esposo querido estar no caixão, mas que no dia seguinte já têm outro na cama. Ir só porque sim, para ser mais um no monte e nas fotografias, não tem sentido nenhum. E depois é sempre a frase da praxe "Era tão boa pessoa...! Coitadinho(a)". Acho tudo isso de uma hipocrisia monumental. Homenagear as pessoas quando estão vivas, não quando já estão a 7 palmos de terra.
    Bjs*

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